domingo, 14 de outubro de 2012

Por que as pessoas que lêem quadrinhos sempre estiveram associadas a idéia de imaturidade e vagabundagem por parte de outras pessoas?



Eu lembro bem quando pré-adolescentes, meus amigos e eu amávamos o mundo dos quadrinhos. Amor esse que se perpetua até hoje apesar do tempo de leitura não ser mais o mesmo de outrora, mas que mesmo assim mantemo-nos atualizados graças as adaptações à telona.
Naquele tempo foi esta a afinidade que nos uniu. E esta afinidade foi revelando tantas outras afinidades com o passar dos anos consolidando ainda mais nossa amizade e perpetuando ainda mais o nosso amor pelas HQs.

Fazíamos nossas próprias histórias em quadrinhos. Criávamos personagens de nossa própria autoria em uma época em que, fechados em nossos mundinhos infanto-juvenis, não tínhamos a menor ideia por não termos conhecimento de que ali também praticávamos a estética do fanzine.

Porém toda essa intensa troca lúdica com meus amigos teve um preço alto em nossa caminhada a adolescência. Éramos considerados nerds em uma época em que sequer existia tal palavra em nosso dicionário. Ao menos em nossa Rua – e isso já nos bastava por que era o único mundo que conhecíamos – éramos vistos pelas meninas da nossa idade como um bando de imaturos e alienados.  Pelos pais destas meninas éramos taxativamente considerados vagabundos.

É verdade que os tempos mudaram e hoje os quadrinhos são vistos como mais uma ferramenta de estimulo a leitura e a isso considero legitimo porque boa parte de minha formação literária deve-se inicialmente aos quadrinhos. Se hoje Oscar Wilde, Hermann Hesse e Augusto dos Anjos entre tantos outros fazem parte de minha biblioteca é porque Turma da Mônica, Disney, heróis da Marvel, DC e Vertigo existiram bem antes.


Mas ainda assim o conceito de HQ não é visto como arte propriamente dita. Boa parte desse conceito é moldada como arte ordinária ou simples mídia de entretenimento (kitsch). Concordo que pelos mesmos preceitos que discuti em texto anterior, o mundo dos gibis, de acordo com suas editoras obedece a um mercado consumista. Por outro lado sem a internet como conseguiríamos ter contato com gibis estrangeiros em outrora sem este sistema de consumo? De uma forma ou de outra a popularidade dos quadrinhos se deu por este mercado e agora com a democratização da internet podemos nos manter atualizados.

Quais seriam os critérios usados para definirmos que as HQs respondem ou não correspondem a “arte pela arte”? Com certeza não seriam as graphic novels que responderiam tais questões embora muitas dessas edições mereçam, pelos seus artistas e roteiristas, tais considerações devido a seu estilo.  A questão é bem mais complexa e discutível que isso.

Mas é justamente nos estratos mais altos de nossas sociedades que objetos de arte fazem parte de um publico que consomem cada vez mais tais objetos. Às vezes nem sempre com admiração estética como de praxe, mas como meras peças ornamentais. Que possuem função apenas para servir de exibição ostentatória a outros em sua sala de visitas.

As HQ’s não obedecem estes seguimentos. Julgo que nem objetos de arte também deveriam. Voltada mais para função informativa e mero entretenimento ela, a HQ,  é vista em muitos outros países como objeto estético. Ou seja, sua apreciação gráfica é colocada como objeto de arte para um publico específico não necessariamente o de galeria. Ainda assim esta arte é apreciada com a mesma contemplação estética. O que dizer dos magníficos traços de desenhistas como Dave Mckean, Bill Sienkiewicz, Frank Miller, David Mazuchelli e tantos outros. Sem falar no âmbito literário como os roteiristas: (o próprio) Frank Miller, Neil Gaiman, Allan More, etc...

Apesar de que as HQs tenham mesmo chegado a este estado de contemplação como objeto de arte entre muitos admiradores, elas ainda encontram resistência nos meios acadêmicos onde elas quase não são mencionadas e quando são é simplesmente para explorá-las ao conceito de Kitsch como arte efêmera.

Talvez porque de fato tal expressão como mídia não faça parte do mercado em que as cifras estratosféricas determinam “o que é de bom gosto” e “o que não é de bom gosto”. Pergunto-me: será que maioria dois intelectuais, admiradores da “boa arte” de fato foram formados por toda a sua vida por livros acadêmicos romances clássicos de nossa literatura universal sem nunca terem acrescentado nenhuma revistinha em quadrinhos em seu cardápio erudito? Eu não acredito.

Mas enfim, ainda nos deparamos com o preconceito daqueles que acham que histórias em quadrinhos são feitos para Nerds.  Talvez não mais ligado a vagabundagem como foi no meu tempo. Mas ainda a imaturidade permanece ligada nesta figura do nerd alienado e anti-social e por isso imaturo como um garoto de cinco anos. Será?

De minha pessoa garanto que boa parte de minhas decisões adultas foram tomadas com o mínimo de inspiração aos arquétipos que ainda alimento em meu imaginário. Estes arquétipos são meus heróis e vilões de HQs.  E se por acaso, muitas dessas decisões e atitudes foram tidas como loucas ou imaturas, é porque foram julgadas segundo categorias impostas por uma realidade que se leva a serio demais. Quero deixar claro aqui que não se trata de negação da realidade, mas apresentar aqui uma visão alternativa que talvez possa salvar o mundo deste caos e absurdo às avessas que aqui estamos submetidos. Isso sim, não nego em dizer que seja um desejo utópico.  







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